# Como Ser Inteligente Sem Ser Arrogante
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## É possível ser um estudante aplicado sem ser um palestrinha?
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[Alexandre Magno Querino A. Silva](https://medium.com/@alexandremagnoquerino?source=post_page---byline--9887225dba2f--------------------------------)
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[Filosófica Mente](https://medium.com/filos%C3%B3fica-mente?source=post_page---byline--9887225dba2f--------------------------------)
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Feb 20, 2021

> O que fazer quando você é a pessoa mais inteligente que você conhece, e está cercado de idiotas? Eis o terrível drama do acadêmico das ciências humanas.
Digamos que você esteja numa mesa de bar, cercado de colegas da universidade. De repente, o assunto da conversa descamba para algo relacionado com _física nuclear_.
Coincidentemente, há um estudante de física na mesa. É quase automático que, quando surge este assunto, todos olham para o _físico em potencial_ e esperam dele algum esclarecimento sobre o tema.
Situações como esta são comuns, razoáveis, e podem ser muito divertidas, **para qualquer estudante que não seja de humanas**.
Lamentavelmente para alguns integrantes deste grupo, situações como essa são verdadeiros pesadelos.
Tanto estudo, tão pouco a acrescentar…
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**Suponhamos agora a situação inversa**. Você é um estudante de ciências sociais e está num bar, cercado de colegas, e aí o assunto da conversa é direcionado para algum problema político.
**Tragédia iminente!**
Diferentemente do caso anterior, seus colegas não se direcionam automaticamente para você, em busca de esclarecimentos sobre o assunto.
Muito pelo contrário: todos tem algo a dizer, experiências pessoais a relatar, reportagens e notícias a citar, princípios morais a declarar, e muito mais!
**É um verdadeiro soco no estômago do _cientista político em potencial_**. Ninguém lhe atribui autoridade sobre o objeto de discussão, ninguém da valor à sua monografia sobre o assunto. Seu artigo publicado, naquela revista que tem como critério científico o _potencial emancipatório da produção_, agora parece sem valor.
> Tanta leitura, tantos debates em corredores, tantos saraus e rodas de conversa. E agora, onde foi parar a sua autoridade?

Banca boêmia de avaliação acadêmica
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Alguns [significados possíveis da palavra “inteligência”](https://www.dicio.com.br/inteligencia/) são:
* “Conhecimento profundo em; destreza, habilidade: ter inteligência para os negócios; cumprir com inteligência uma missão.”
* “Habilidade para entender e solucionar adversidades ou problemas, adaptando-se a circunstâncias novas.”
* “Boa convivência; união de sentimentos: viver em perfeita inteligência com alguém.”
Curiosamente, este último significado é o que mais falta nos acadêmicos das ciências humanas. Não é preciso nem comentar o grau da tragédia quando também faltam os outros dois…
**Conviver com essas pessoas é particularmente difícil**. Qualquer conversa inocente pode ser razão para um grande discurso sobre justiça, uma explicação detalhada sobre a história da Alemanha do séc. XVIII, entre outras chatices.
Eu, particularmente, entendo. Também padeço deste sentimento latente de sair por aí ofertando palestras e minicursos gratuitos em qualquer padaria ou ponto de ônibus.
**A autoimagem de pessoa _inteligente_ é muito comum nesse contexto, o _ego_ inflado e sensível é quase um sintoma**. Suponho que a razão disso possa ser explicada a partir do exemplo do bar, citado acima. Examinemos!
A vida do acadêmico das ciências humanas não é fácil assim como parece. É uma área pouco valorizada socialmente (isso é mérito nosso, infelizmente). Recebemos menos investimento, afinal, livros são mais baratos que aceleradores de partículas. E fazemos pesquisa (na maioria dos casos) sobre coisas que estão entrelaçadas com a experiência cotidiana das pessoas, o que curiosamente gera uma _feedback_ muito negativo do público.
Vou ofertar um exemplo.
> Se discute, na área de filosofia, a possibilidade lógica da existência de entidades fictícias. Este é um tema relevante para a filosofia da linguagem.
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> Mas, quando um cidadão honesto e pagador de impostos se depara com um artigo científico (financiado por dinheiro público) que chega à conclusão de que “unicórnios não podem existir”, um sincero e sonoro “P#$@ que pariu!” é compreensível.
>
> Este mesmo cidadão poderia dizer “Pagam alguém para pesquisar isso? Eu já sabia disso! Meu deus!”
O caso é que o pesquisador obtém um _grau de certeza_ mais elevado que o cidadão mencionado, mesmo que este pense estar absolutamente certo do que diz. **Porém, embora este grau de certeza seja muito apreciado no meio científico, é absolutamente irrelevante numa mesa de bar.**
Diante dessa situação, quando sentamos numa mesa de bar e surge um tema vinculado diretamente com o que tanto estudamos, uma vontade de falar e mostrar que sabemos do assunto surge e nos domina! Porém, essa vontade é tolhida porque ninguém se importa muito com a opinião do cara de humanas.
Eu gostaria de dizer, sinceramente, que não há mal nenhum nisso.
**Não estamos numa banca boêmia de avaliação acadêmica, estamos entre amigos e colegas, socializando**. Ser _inteligente_, neste contexto, está mais ligado a saber se adaptar à situação e conviver bem com as pessoas do que mostrar qualquer conhecimento científico.
Se meter a dar explicações meticulosas e _não solicitadas_ sobre política, ética, história, etc. (temas sobre os quais todo mundo tem alguma opinião formada) é arrogância pura e simples. É estar num contexto em que todos tem pontos de vista de igual valor e querer se colocar _acima dos demais_, apoiando-se numa formação acadêmica que pouco ou nada interessa àquelas pessoas ali presentes. Correndo o sério risco de ser apenas visto como _metido a sabichão_.
**Ora, alguém poderia me questionar: então deveriam as pessoas de humanas se esconder, se calar, em momentos assim?** Em minha opinião: é claro que não!
Há algo de interessante, muito mais divertido que uma palestrinha, que podemos fazer.

Ao invés de palestrar, acrescentar!
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Ser uma pessoa que conhece boa parte da história do pensamento humano, que é habituado com a leitura filosófica ou que estuda teorias sociais e econômicas, não precisa ser um fardo para quem está próximo. Muito pelo contrário, pode ser bastante divertido e valoroso!
**O primeiro passo é, sem dúvidas, lutar constantemente contra a _tendência de ser arrogante_**. Experimente sempre se lembrar de que você não está numa banca, ninguém liga para os seus artigos publicados ou para quantos livros você supostamente leu. Evite, portanto, a supervalorização indevida de suas capacidades intelectuais.
**O segundo passo é saber como utilizar do tanto de conhecimento que você acumula estudando na universidade, com a finalidade de oferecer aos seus colegas e amigos uma ótima experiência de conversa.**
Note que sua experiência na área pode transformá-lo numa boa fonte de curiosidades históricas, fatos engraçados e teorias malucas (embora não só isso, é claro). **Este pode ser um ótimo modo de ser inteligente sem ser arrogante.**
Agir assim certamente é bem melhor que ser uma fonte de discursos chatos, que só servem para fazer com que as pessoas se sintam ignorantes e incapazes de debater com você, o que é um saco!
> Ao invés de fingir que sabe grego ou alemão, por que não contar uma história engraçada e pertinente sobre a vida de um político ou filósofo?
**Em minha opinião, o mundo, e os bares, seriam muito melhores se as pessoas de humanas fizessem mais isso.**
Eu sei, eu sei, “não são só as pessoas de humanas que são chatas”. Mas o que eu posso fazer? Ao menos em minha experiência pessoal, a proporção de chatice das pessoas que eu conheço é muito maior nas que são de humanas. Além disso, esta é minha área, acho que compreendo melhor essa tendência arrogante que (todos nós) temos.
Eu ficaria realmente muito satisfeito de saber que este realmente não é um mal exclusivo de nossa área humanista, gostaria de ver alguém de outra área (seja naturais, exatas, etc.) falando sobre o assunto.
**Bom, acredito que há pelo menos duas formas de encarar este texto**. Ou como um simples insulto generalizado aos acadêmicos das ciências humanas, recheado de ressentimento e perspectivismo. Ou, como um convite para uma reflexão sobre nossos vícios, cometidos muitas vezes sem querer, mas que causam impactos negativos em nós mesmos e em quem está em nosso redor.
Quem sabe a simples atitude de não ser o _palestrinha_ possa mudar a visão que o público tem de nosso campo do conhecimento, talvez até atrair novos estudantes.
Bom, independente disso ser possível ou não, ainda assim a arrogância é um vício, uma falha moral, que deve ser combatida por cada um que padece deste mal. Por um convívio melhor em sociedade, por um mundo melhor para viver.
_Obrigado pela leitura, espero que você esteja bem nesse momento. Tome todos os cuidados, o coronavírus não é uma ameaça teórica, é real! Se puder, fique em casa._
_Não esqueça de que os claps vão de 1 a 50!_